Qual a idade das vítimas e onde esses crimes estão ocorrendo?

Juliana Freitas | 15/06/2018

Em 2014, o IPEA realizou uma pesquisa acerca da “Tolerância social à violência contra as mulheres”, chamando atenção para algumas características patriarcais marcantes da sociedade. Através desta pesquisa pode-se constatar que 58,5% das pessoas entrevistadas concordaram, total ou parcialmente, que “se as mulheres soubessem se comportar haveria menos estupros”. Outro pensamento constantemente repercurtido é o de que as vítimas de estupro são, em sua grande maioria, mulheres que facem uso de álcool, andam desacompanhadas em ruas escuras, usam roupas curtas e outras características ditadas pela cultura do estupro1,2,7.

As ideias mencionadas acima acabam fazendo, cruelmente, com que a culpa do crime recaia sobre a vítima (estupro nunca é culpa da vítima). A partir disso, esse post foi feito com o objetivo de mostrar pontos importantes que vão contra as ideias mencionadas acima; além de apontar para características impactantes sobre crimes de estupro.

Idade das vítimas

O primeiro ponto a ser mostrado com o intuito de contradizer os pensamentos comuns expostos acima, será em relação à idade. A Figura 1 mostra o boxplot das idades (no momento da ocorrência do crime) das mulheres vítimas de estupro, para os casos notificados de 2011 a 2016. Esse gráfico possibilita a visualização da distribuição da idade das vítimas que notificaram o crime, e também fornece informação sobre a variabilidade.



Com base nessa figura, podemos observar que os boxplots pra cada ano são bastante similares. Ou seja, levando em consideração a idade, o perfil das vítimas é praticamente o mesmo ao longo desses seis anos. Além disso, a idade mediana em todos esses anos foi igual a 14; isso significa que em 50% dos casos notificados, as vítimas tinham até 14 anos de idade. Esse fato agrava ainda mais essa realidade, uma vez que, segundo o código penal brasileiro, pessoas com menos de 14 anos não podem consentir com relações sexuais; se configurando então em estupro de vulnerável3,4. Nesse mesmo sentido, também foi possível verificar que em 25% dos casos notificados, as vítimas possuíam até 11 anos na data de ocorrência do crime.

Essas análises levam a crer que mesmo ao passar dos anos, com medidas sendo tomadas e casos vindo à tona, crianças continuam sendo estupradas. Faz sentido pensar também que, o fato de grande parte das vítimas serem tão novas, pode ser mais um fator que faz com que a taxa de subnotificação desse crime seja tão alta.

Local de ocorrência

Um outro ponto abordado nesse post diz respeito ao local de ocorrência dos crimes de estupro em mulheres no Brasil. Assim, a Figura 2 mostra o número de casos notificados por local de ocorrência, nos anos de 2011 a 2016.

Por esse gráfico podemos ver os tipos de locais nos quais os crimes de estupro estão ocorrendo, assim como o número de notificações para cada um deles em cada ano (clique no nome da categoria para adicioná-la/removê-la do gráfico).



Observando o gráfico, podemos notar que para todos os anos estudados, o local onde aconteceu a grande maioria dos casos notificados foi “residências”. Isso nos traz mais evidências de que os pensamentos listados no início desse post não fazem sentido e acentua ainda mais a gravidade perante a esse crime. Em seguida, o local de ocorrência com o segundo maior número de notificações foi “via pública”. Além disso, chamamos atenção para os seguites itens:

  • a categoria “outros” contempla locais como matagal, motel, terreno baldio, carro, …;

  • a categoria “ignorado” representa de 7% a 10% dos casos notificados. É válido questionar porque não há essa informação em tantos casos;

  • em 2016 houve 276 casos notificados cujo local de ocorrência era escola, isso representa cerca de 5 casos por semana;

  • sobre a categoria “local de prática esportiva”, vale lembrar o escândalo na equipe de ginástica artística5,6.


Espera-se que quanto maior for o conhecimento a respeito desse tema, mais eficazes serão as medidas tomadas visando combater esse crime. Baseado nessa ideia, esse post foi elaborado com informações importantes sobre esse crime que precisam ser difundidas.


Observações:

  • os dados de 2015 e 2016 não estão consolidados;

  • ao longo dos anos, havia em torno de 2% a 5% de valores faltantes na idade da vítimas;

  • é importante notificar os casos de estupro (opções: ligar 180 ou ir ao centro de saúde mais próximo).


comments powered by Disqus