Guilherme L. de Oliveira | 06/05/2018
A subnotificação se faz presente quando algum evento de interesse como, por exemplo, ocorrência de um crime ou diagnóstico de uma doença, é notificado/registrado em menor quantidade do que seria esperado ou devido. Quando os dados disponíveis apresentam este tipo de problema, estimativas de taxas e índices tendem a ser viesadas no sentido de representarem algo aquém da realidade. Isto dificulta a percepção da necessidade de políticas públicas de intervenção e controle, dentre outras coisas.
Evidências de subnotificação de casos de estupro no Brasil
“Apenas 35% das vítimas de estupro costumam relatar o episódio às polícias” é o que evidencia o 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2013) baseado em pesquisa americana1. Este baixo percentual de reportação aos órgãos policiais surpreende e gera grande desconforto quanto às taxas de estupro2 periodicamente divulgadas para os estados e municípios do Brasil. A situação fica ainda pior se nos basearmos em pesquisas e estudos nacionais sobre a qualidade de registro dos casos de estupro e demais violências interpessoais.
Segundo a Pesquisa Nacional de Vitimização de 2013, primeira deste tipo feita no Brasil, verifica-se que apenas 7,5% das vítimas de violência sexual registram o crime na delegacia. Ou seja, por motivos diversos, 92,5% das vítimas deixam de reportar o ocorrido aos órgãos policiais responsáveis por investigaro crime.
Ainda, na nota técnica “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde”, produzida pelo IPEA em 2014 com base nos dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) gerido pelo Ministério da Saúde, estimou-se que a cada ano no Brasil 0,26% da população sofre violência sexual. Isto indica que haja, anualmente, 527 mil tentativas ou casos de estupros consumados no país (quase 1 caso por minuto), dos quais apenas 10% são reportados à polícia.
Enfim, o fato é que os dados oficiais sobre estupro publicados anualmente tanto pelas Secretarias de Segurança Pública quanto pelo Ministério da Saúde por meio do Sinan apresentam alto índice de não-reportação.
Visualizando o problema nos municípios brasileiros
Uma consequência do percentual de reportação tão baixo é que um grande número de municípios apresenta contagem nula de casos. Por exemplo, segundo os dados do Sinan 2016, 71,22% dos municípios brasileiros não apresenta registro de casos de estupro em mulheres. Isto implica numa taxa de ocorrência nula para a maior parte do país como pode ser visto na Figura 1. Os municípios em que nenhum caso de estupro em mulheres foi reportado no ano de 2016 estão destacados em cinza. Uma análise crua dos dados apresentado nesta figura poderia nos levar a concluir que diversas regiões do pais representam um padrão a ser seguido, já que o crime de estupro não está presente na maioria dos seus municípios. Dentre elas, por exemplo, o estado da Paraíba e o interior do estado da Bahia. Sabemos, no entanto, que na prática isto não é verdade, mas sim justificado pela não-reportação dos crimes lá ocorridos.